Pai, o Nosso Ídolo

Pegou moda comemorar tudo com “o dia de…”, com o propósito de nos levar a pensarmos num determinado assunto, pelo menos uma vez no ano, embora corramos o risco de, face a tantas comemorações, banalizarmos a importância dos factos ou lemas que se comemoram. Das mais antigas comemorações, encontram-se o “dia da mãe”, este com data móvel (no primeiro domingo de Maio) e o “dia do pai”, em Portugal, no dia 19 de Março. Ao que tudo indica, a criação destas duas celebrações assentaram na ideia de fortalecer os laços familiares e o respeito por aqueles que nos deram a vida e, nos países cristãos, há uma simbologia assente nos pais de Cristo, cujo presépio representa.
Nos últimos séculos, as sociedades ocidentais têm sofrido profundas alterações na estrutura das suas instituições e a família, como célula base, foi das que mais sofreu. Quando as sociedades começaram a organizar-se em nações, surgiu a figura do casamento para sustentação da família, que, normalmente, só com a morte dum dos conjugues se desfazia, porque os divórcios eram proibidos e raros. Hoje, faz mais sentido falar na conjugalidade, onde um casal surge quando dois indivíduos se comprometem numa relação que pretendem que se prolongue no tempo e constitui um espaço de apoio ao desenvolvimento familiar, em articulação entre individualidade e conjugalidade, ou seja, os dois elementos do casal têm que negociar a vivência a dois o que implica tomar uma série de decisões no quotidiano comum, que para além dos benefícios, também implicam sacrifícios dos conjugues. Uma união conjugal não conduz, necessariamente, à paternidade e maternidade, pois muita gente opta por não ter filhos, vivendo então a conjugalidade duma forma egoísta, com reflexos na natalidade e na sustentação do modelo de sociedade. São opções, porque ser pai e ser mãe é uma das mais importantes tarefas de que o ser humano vivencia, com tudo de belo que ela significam, mas “não há bela sem senão” e, neste papel, esta é também uma tarefa de grande sacrifício individual e duma enorme responsabilidade, porque o ser humano é dos poucos “animais” que não nasce nem sobreviveria de forma autónoma como muitas espécies do mundo animal.
Se o papel da mãe é de vital importância, até porque é ela que realiza a gestação, o papel do pai, depois de “depositar a sementes”, pode começar a ser desempenhado ainda na barriga daquela que engravidou, porque a interacção com a criança começa ainda naquele idílico lugar donde somos expulsos, prematura e violentamente, ao fim de nove meses. Depois, começam os maiores trabalhos e responsabilidade e a partir daí se vê o verdadeiro pai, isto é aquele que vai ser a referência masculina na criança, independentemente do género (F ou M) desta. Ademais, as relações laborais alteraram-se profundamente, com a crescente integração da mulher no mundo do trabalho, com reflexos na família, pelo que o papel do pai, aquele que era a reserva de autoridade e o ganha pão, passou também a ser um agente participativo nos cuidados e na educação da criança durante a sua fase de crescimento e socialização. O pai é fundamental na formação da personalidade da criança, e como ela desenvolverá diversas características até a idade adulta.
Embora em número crescente, infelizmente ainda há muitos que se demitem desse papel, quando mesmo não fogem, optando pela rotura conjugal e deixando a criança aos cuidados da mãe. São muitos os reflexos na “criança abandonada”, nomeadamente na sua formação, educação e equilíbrio emocional, com graves consequências na sua formação humana. A criança ou o jovem, “perde o pai presente” que tanta falta lhe vai fazer no seu crescimento, porque perde a referência masculina e que, ainda para agravar, vai ser inserido num sistema de ensino predominantemente feminino, isto, praticamente desde o infantário até à entrada na universidade, os cuidadores, educadores e formadores são largamente do sexo feminino. As consequências deste excesso de femininização na socialização humana ainda não estão avaliadas, mas algo de mau vai grassando por aí, pelo que não seria de todo errado atribuir esses males também, mas não só, à “ausência do pai” que não tem, necessariamente, que ser o pai biológico. Nos pais homossexuais, com filhos biológicos dum deles ou adoptados, a referência do outro género não facilita a socialização. Porque celebramos, por estes dias, o “Dia do Pai”, prestemos homenagem aos nossos pais, mas também meditemos na sua imprescindível importância nas nossas vidas, como educadores e como referências.
Eu, perdi o meu pai, por causa duma daquelas doenças da época e a partir dali, foram poucas as vezes que com ele convivi, até este falecer, mas ficaram-me, para sempre, as recordações daqueles sete anos duma paternidade simples e própria do mundo rural da década de cinquenta e depois, sempre com curtas visitas, nos nove anos de internamento, ouvia atentamente os seus conselhos e, após cada despedida, com lágrimas não contidas, pensava em todos os seus conselhos que me atingiam a alma e uma profunda tristeza, pois nem num abraço de conforto me poderia refugiar. Dentre os muitos, um deles gravou-se-me bem no fundo da alma: “Filho, faz-te homem, já que eu não posso ajudar-te”. E eu cumpri, também em homenagem ao meu pai e porque ele, fisicamente ausente, foi e continua a ser a minha estrela-guia lá no céu, para onde partiu há cinquenta anos. Não nos “abandonou”, a mim e aos meus cinco irmãos, e esse destino deu-nos forças para lutarmos, porque a morte é menos violenta nos filhos do que o “abandono”.
Pai não é aquele que apenas nos dá a vida, mas sim o pai que nos educa com amor, porque educar é a maior obra que poderemos fazer por um ser humano. Se não soubermos ou não quisermos educar as crianças e os jovens, a justiça poderá ter que vir as puni-las, quando forem adultos. As prisões estão cheias!

Serafim Marques
(Economista reformado)

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