A Nicho Associação Cultural apresentou o projeto “Diálogos”, com estreia marcada para quinta-feira na freguesia de Côta, uma das três freguesias de baixa densidade do concelho de Viseu nas quais decorreu o projeto que foi concebido durante o confinamento.
“Os diálogos destes ‘Diálogos’ acontecem a vários níveis. Entre a sede do concelho e três das suas freguesias mais distantes e consideradas de baixa densidade populacional, e depois entre artistas (…) e estas três comunidades que partilham o processo criativo, cujo resultado são três performances criadas a partir das memórias dos mais antigos, dos mais velhos destes territórios”, explicou o dirigente da Nicho Associação Cultural.
Graeme Pulleyn explicou ainda, na apresentação do projeto, que criou o espetáculo em 2019, para ser apresentado em 2020, e que acabou por ser “concebido nos meses mais críticos de confinamento por causa da pandemia, em março e abril”.
“Onde era suposto entrevistar as pessoas mais velhas das comunidades ao vivo, realizaram-se conversas à distância através de intermediários locais, de videoconferências, gravações em telemóveis. Onde estava previsto os artistas realizarem muitas horas de residência e criação nas freguesias, tivemos de nos contentar com algumas visitas ao domingo à tarde”, explicou.
Após meses de trabalho, nasce em Côta a “Desgarrada”, com Dennis Xavier e César Prata. É o primeiro espetáculo a estrear, na quinta-feira, num espaço ao ar livre da freguesia e com o cumprimento das normas de higiene e segurança da Direção-Geral da Saúde (DGS).
Em agosto, Joana Martins e Joana Pupo apresentam “O fio e a meada”, criado e estreado em Calde e, em setembro, Emanuel Santos e Patrick Murys apresentam “De onde não se vê o fim”, criado em Cavernães.
Cada um destes espetáculos vai, nos dias seguintes, às outras freguesias que entraram no projeto e terminam na sede do concelho, em Viseu, num total de 16 espetáculos, o mesmo número que esteve delineado desde o início.
“Entre dezembro e janeiro de 2021 juntam-se estas três criações num diálogo final, num espetáculo com a participação de todos estes artistas”, concluiu Graeme Pulleyn que fez questão de assumir que, “apesar de todas as alterações ao projeto de adaptação, face o isolamento”, os ‘Diálogos’ “reinventaram-se e estão aí para desmontar esse isolamento”.
Presente na apresentação, Dennis Xavier contou “a expectativa não foi muito frustrada”, até porque “ainda houve diálogos com algumas pessoas”, antes de começar o confinamento, “se calhar, a quantidade de recolha de memórias é que poderá ter ficado comprometida”.
“Falámos com poucas pessoas, porque estavam assustadas, com pouca vontade de sair de casa e muitas idosas estavam em lares onde já não foi possível ir. Ainda assim, com a ajuda de várias pessoas, conseguimos recolher histórias e, no caso de Côta, conseguimos recolher a memória de duas pessoas, que falaram de outras memórias de outras pessoas e fizemos o espetáculo com base nisso”, explicou Dennis Xavier.
“Diálogos” é um projeto apoiado pelo programa Viseu Cultura, da Câmara Municipal de Viseu, que o vereador da Cultura, Jorge Sobrado, fez questão de elogiar, “pela capacidade de aceitação e resistência” deste projeto que não parou no decorrer da pandemia de covid-19.
“A Nicho não é apenas artisticamente preparada, mas é tecnicamente inteligente para se adaptar a tempos difíceis. Nós precisamos de uma cultura inteligente que se adapte a tempos difíceis, ou seja, uma cultura que não desiste, que não atira a toalha ao chão e que não protela, nem adia, que não suspende nem entrega os pontos e é capaz de encontrar outros caminhos”, destacou.
Jorge Sobrado destacou ainda o facto de este projeto “não ser só descentralizado na sua apresentação, que é a descentralização banal”, mas sim ser “um projeto com vocação de descentralização cultural, porque é também a descentralização da criação, porque a base do trabalho artístico faz-se na periferia que é a matéria-prima do projeto”.
Foto : Luis Belo