A comunicação social tem noticiado, e as redes sociais reproduzido e amplificado, casos de treinadores de formação que têm tido comportamentos intoleráveis, ou mesmo criminosos em alguns casos. Estes casos nada têm a ver com a atividade de quem a exerce, mas sim com a falta de caráter e a má formação do indivíduo.
Servem estas notícias para refletir sobre o papel do treinador, de quem o contrata e porquê. Se o treinador não tem comportamentos adequados, são os clubes os grandes responsáveis, pois não são exigentes na sua escolha. O perfil do treinador não é considerado importante, quando o devia ser. Não chega ter formação técnica e académica para se ser formador. Até quando se vão permitir desvios comportamentais éticos e desportivos em troca de vitória efémera e, quase sempre, utilizada como vaidade pessoal?
Para que serve ter conhecimentos de teoria e metodologia de treino, de fisiologia do esforço quando não se tem perfil para lidar com crianças e jovens?! O treinador é responsável pelo equilíbrio no desenvolvimento físico, mental e espiritual dos atletas, tendo em conta que estes são os fatores fundamentais de uma perspetiva de vida equilibrada.
A falta de recursos financeiros não serve de justificação para contratar o treinador barato ou mesmo voluntário. Os custos destas opções são enormes. É preciso ter noção de que, de uma forma indireta, os treinadores são das pessoas mais influentes na orientação pessoal e educativa dos jovens com quem lidam. São-no, quer tenham ou não consciência dessa ação no sentido positivo ou negativo. Os testemunhos dos atletas confirmam a preponderância do papel do treinador que para a maioria das crianças e adolescentes é uma das pessoas com mais importante significado pessoal. É notável a forma como os atletas depositam a sua confiança nesta pessoa, com o propósito de atingirem os seus objetivos pessoais.
A entrada da criança na prática desportiva é determinada por motivações banais como a influência dos pais ou por influência de um amigo/vizinho. Nesta etapa é para a criança se divertir, ter experiências no desporto e entusiasmar-se com os desafios que a modalidade proporciona. Aqui, os treinadores devem ser atenciosos, alegres, centrados no processo e não no produto, o que significa que não atribuem ao resultado do jogo o objetivo essencial.
A principal função de um treinador da formação é potenciar o atleta e não vencer mais vezes. Este desempenho tem de ser enquadrado na filosofia do clube e coordenado por quem tem essa responsabilidade para que atletas e familiares percebam desde início as tomadas de decisões.
A necessidade de demonstrar cada vez mais cedo resultados desportivos incita muitos treinadores a acelerar o processo de formação dos seus atletas, o que, mais tarde, origina barreiras de rendimento muito difíceis de superar e que normalmente estão associadas ao abandono precoce da prática desportiva.
Ser bom treinador não é algo com que se nasça, nem é algo que resulte de anos de experiência. Os treinadores devem refletir e aprender as lições na sua própria vivência desportiva, para serem cada vez melhores.
A árvore não faz a floresta. É verdade. Maus profissionais existem em todas as atividades.
Vítor Santos
(Embaixador do PNED)