Local Galeria da ACERT, Tondela.
Data de 11 de Maio a 29 de Junho, de 2ª feira a Sábado.
Horário das 15h às 23h.
A Escola Informal de Fotografia e a ACERT
apresentam a exposição colectiva de artes visuais “Aproximar-nos do Caos [com umas lentes que permitam ver melhor o que isso é]”, no próximo dia 11 de Maio, na Galeria da ACERT, em Tondela, – com uma sessão inaugural das 17h às 19h e uma segunda sessão das 21h às 23h.
A exposição reúne obras de doze autores, com curadoria de outros sete artistas, num trabalho colectivo, a partir da reflexão teórica do filosofo José Gil, em torno do Caos e da Criação Artística.
Fragmento do texto curatorial
“[…] a Arte, e em especial a Arte Contemporânea, procura a provocação, a perturbação e
a disrupção, numa tentativa de abalar essa ordem habitual das coisas, alimentando-se desta
forma do caos como energia, força motriz, que permite ao artista a criação de algo novo.
Segundo José́ Gil “toda a obra de arte, mesmo quando visa reproduzir o mais fielmente
possível um original, traz consigo qualquer coisa de novo” e “por pouco que se procure qualquer
coisa de novo, o estado mental do artista tende para o caos”. Poderá́ então o pensamento de
Nietzsche, de que “é preciso o caos para que brote uma estrela”, aplicar-se também à arte?
Serão então estas forças e estes movimentos caóticos os geradores e potenciadores das obras
de arte e os artistas os sujeitos que as materializam?
E se o artista, pela sua própria condição, consegue percepcionar essa energia, esse todo e
simultaneamente o nada, e o transforma em obra criativa, poderá a própria obra ser vista como
uma lente que nos permite, a nós público, fazer um movimento de aproximação, de forma a
perceber afinal que caos é esse?” […]
FICHA ARTÍSTICA E TÉCNICA
TÍTULO
Aproximar-nos do Caos [com umas lentes que permitam ver melhor o que isso é]
COORDENAÇÃO | Susana Paiva
AUTORES
Ana Botelho, Carlos Dias, Elsa Figueiredo, João Vasco, Leonor Duarte, Mário Azeve
Aproximar-nos do Caos [com umas lentes que permitam ver melhor o que isso é]
Caos. Do grego káos, do verbo khainen, abrir-se, entreabrir-se.
Termo utilizado aparentemente pela primeira vez na “Teogonia” de Hesíodo (séc. VIII a.c.), designando o vazio
causado pela separação entre a Terra e o Céu a partir do momento de emergência do Cosmo. Designa também para
os gregos o estado inicial da matéria indiferenciada, antes da imposição da ordem dos elementos.
(JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 5.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008)
[…] Na sua série “3ª – retratos de uma viagem ao interior”, da qual fazem parte as imagens
“Diana” e “Janela” que integram esta exposição, João Paulo Barrinha procura mais a forma
como vê a realidade, do que a realidade em si. As suas imagens reflectem, deste modo, as suas
miragens – representações, muitas vezes surreais, dos seus sonhos e das suas memórias. Se
uma imagem é [uma] memória, apenas poderá ser a do seu autor. […]
[…] Quando olhamos para o trabalho “Território e Caos” de Raúl Salas somos transportados
para um imaginário abstracto. Nas suas imagens, o autor, explora a essência do caos através
de impossibilidades, criando territórios e tempos fictícios que co-habitam numa espécie de
contínuo espaço-tempo (wormhole), induzindo um conflito de ordem. São fragmentos de
tempos passados e presentes, vestígios de sociedades humanas antigas que convergem na sua
obra, numa espécie de narrativa onírica cuja desconstrução implica tempo, imersão e
proximidade ou, bem pelo contrário, afastamento e abstracção – essa é escolha que caberá ao
público. […]
[…] Ana João Romana (em colaboração e com referência à obra de Susana Anágua exposta em 2014 na Carpe Diem) e João Vasco, apesar dos seus distintos percursos e influências, convergem nesta exposição na utilização da cartografia para operacionalizarem discursos
artísticos centrados em energia e matéria, luz e terra.
A luz da cidade de Lisboa funciona como sujeito explicito da obra “18º abaixo do horizonte”
de Ana João Romana, onde a luz é abordada de uma forma latente, mas carece de luz presente
para que se revele. […]
[…] Por seu lado, a prática artística de João Vasco é alicerçada na fotografia documental e
numa certa antropologia visual, que o autor utiliza como veículo gerador de consciência social.
Em “Unidade Convulsa”, que agora apresenta, o autor faz emergir o seu background académico como geógrafo e invoca a cartografia como testemunho, uma memória da sua própria experiência, do seu caminho no mapeamento do Caos, que muito para além de ser geofísico, é intrinsecamente interior. […]
[…] Entramos agora na obra “Self” de Elsa Figueiredo, no seu caos, pelo lado [mais] escuro à procura da claridade […] Talvez precisemos de silêncio para melhor Ver e Entrar neste caos, para encontrar o túnel que nos leva até à luz. Também aqui, como nos trabalhos de Ana João Romana e João Vasco, o silêncio será a lente que nos ajudará a entrar na pele da(o) outra(o) e melhor compreender o que expressa Elsa Figueiredo. […] parafraseando a autora, “é através da busca constante daquilo em que falhamos e daquilo que nos faz falta, do vazio por
preencher, que caímos muitas vezes no Caos”. […]
[…] Na obra “Mais alto! Mais altos! Sem parar! [Louder! Taller! Non-Stop!]”, de Mário
Azevedo, o desejo humano é entendido como um poder destruidor da Natureza – uma força
que atenta contra o passado natural, o pré-existente -, uma contínua procura do novo que
ameaça o que está sedimentado. […] Na obra apresentada nesta exposição, o autor adopta a
estratégia de criar um diálogo conflituoso entre duas imagens, […] [ao qual acrescentou] uma
dimensão auditiva, cuja criteriosa banda sonora a escutar em registo imersivo, ela própria
oscilando entre caos e harmonia, cria uma nova ligação entre imagens, agudizando
inevitavelmente o referido conflito. […]
[…] Equacionando o crescente interesse, na abordagem artística contemporânea, pela conflituosa dicotomia Público versus Privado, com tónica nos conceitos de Liberdade e Transgressão, abordamos as obras “Ceridween” de Ludmila Queirós e “Paisagem-Passagem” de Carlos Dias, elegendo a transgressão como peça nuclear do discurso que as une. […]
[…] Carlos Dias aborda o próprio acto criativo como transgressão, sem regras, algo bem patente no manifesto do movimento Lomográfico que o autor adopta como fundamento do trabalho que agora apresenta. No caso de Ludmila Queirós […], a transgressão é corporizada através do olhar do espectador, testemunha (in)voluntária dos seus registos/testemunhos que alimentam o jogo deliberado de diluição do espaço/acto público e privado. […]
[…] O que une as obras “The true face” de Ana Botelho e “Paintball field” de paula roush, aqui apresentadas, e que, nas suas múltiplas acepções, simultaneamente as separa, é a antítese da face humana, em alguns dos inúmeros significados que lhe são atribuídos: a
máscara. A máscara, física ou psicológica, – esse outro eu – que permite ao seu utilizador, o
mascarado, dissimular a sua identidade, transformando a sua aparência, através da sua
evidente função de adaptação social. […]
[…] “Paintball field”, enquanto jogo de disfarces, ironiza o jogo da guerra e expõe, segundo
a autora, “a glorificação da morte implícita na narrativa do jogo”. […] Todos desempenham um
papel, numa outra pele e identidade: a de caçadores e de presa, como num conflito real.
Por seu lado, a narrativa construída por Ana Botelho em “The true face” utiliza a máscara
para discursar sobre um Caos interior, na continuidade de uma reflexão pessoal que a autora
havia iniciado, em “Há dias que gosto mais do que outros”, publicado em 2018, e que não
versando uma guerra de todos os Homens, aborda um conflito intrinsecamente seu. […]
[…] Unidas pela fragmentação da imagem que propõem nas obras, Leonor Duarte e Sofia
Pereira Santos encontram na ilusão o mecanismo perfeito para equacionar a natureza do seu
olhar, e das suas próprias imagens, para através delas reflectir sobre as diferenças entre
representação, ilusão e realismo.
[…] Se a obra “Pode uma suave brisa mudar o mundo?”, de Sofia Pereira Santos, opera a
sua reflexão evocando o espaço – na verdade um duplo espaço, da maquete do seu fotolivro e
do(s) lugar(es) que este representa, – para equacionar a sua necessidade pessoal de
permanente procura, já “S/título” de Leonor Duarte, na sua dupla natureza pictórica e
referencial, elege o tempo, […], como o eixo discursivo que lhe permite reflectir,
metaforicamente, sobre a forma como “a natureza se apropria do construído, recriando-o de
uma forma que invoca o sagrado.”
Apesar das suas diferenças, é também aqui, na dimensão da recriação, que se voltam a
interceptar as obras destas duas autoras – no seu desejo de permanente reinvenção das
possibilidades do olhar, usando como pretexto um corpo em perpétua demanda de viagem.
Inevitavelmente imbuídos da “força devastadora do caos [que] varre e destrói os estratos
habituais do pensamento, das afecções, da linguagem, provocando um vazio a partir do qual
se constrói a singularidade”, mergulhamos uma última vez nas sábias palavras de José Gil em
“Caos e ritmo”, conscientes que é “no plano das matérias de expressão, no plano das formas,
estruturas, composições que germina o caos” e, sendo este, também, um discurso curatorial
elaborado por artistas que reflectem sobre a obra e práctica de outros artistas, não resistimos
a concluir com uma nova citação do referido livro, “[…] mas é também no espírito e no corpo
do artista [que germina o caos], porque ele habita inteiramente o espaço e o tempo da obra,
tal como estes invadem as suas sensações e o seu pensamento. Um plano – de matéria e
energia – liga a obra ao artista e inversamente, o artista à obra. É nele que o caos se instala e se
estende. […]”
Excertos do texto curatorial da autoria de Arlindo Pinto, Dora Pinto, Fátima Lopes, Fernando Alves, Paula Arinto e Susana Paiva
Imagem :CAOS_©João_Vasco